Ingrid Guimarães relatou, em seu perfil no X (antigo #Twitter), uma situação de constrangimento em um voo da American Airlines de Nova York para o Rio de Janeiro, no dia 7 de março. A atriz afirma ter sido coagida a deixar seu assento na classe Premium Economy (categoria intermediária entre executiva e econômica) para ceder lugar a outro passageiro, devido a um problema com uma cadeira na classe executiva.
Segundo a atriz, a companhia aérea não ofereceu explicações e a ameaçou, dizendo que ela nunca mais viajaria pela American Airlines caso não cedesse o lugar. Funcionários teriam anunciado no microfone, na frente de outros passageiros, que o voo atrasaria devido à atriz, que se recusava a trocar de assento.
Este episódio envolvendo a atriz Ingrid Guimarães e a American Airlines trouxe à tona uma série de questões que vão muito além de um simples problema de manutenção de aeronave: envolve a construção de uma cultura organizacional sólida e sua aplicação no dia a dia. A forma como a companhia aérea lidou com a situação gerou uma crise de reputação que poderia ter sido evitada com uma atuação mais estratégica em áreas como cultura organizacional, compliance e gerenciamento de crise.
Vamos analisar a fundo cada um desses pilares e extrair lições valiosas para qualquer empresa:
1. Cultura Organizacional: o DNA da empresa
“A cultura come a estratégia no café da manhã”, já dizia Peter Drucker. A cultura de uma organização é a alma da empresa. O conjunto de valores, crenças e comportamentos que guiam as ações de todos os colaboradores deve ser vivenciado e não apenas definido. Uma cultura forte é como uma bússola, orientando as decisões e garantindo que todos estejam remando na mesma direção.
Quando empresas e líderes vão entender que não se trata apenas de ter um quadro bonito na parede? Cultura vivida no dia a dia retém talentos, fecha negócios e satisfaz clientes.
No caso da American Airlines, a falta de uma cultura que valorize o cliente e promova o respeito à diversidade ficou evidente. A forma como a atriz foi tratada, sendo coagida a ceder seu assento e exposta publicamente, demonstra que a empresa precisa rever seus valores e fortalecer a cultura interna.
Mas como criar uma cultura organizacional sólida? 🤔
- Viva a cultura da empresa: Quais são os princípios que norteiam a empresa? Respeito, ética, diversidade, inovação? Mais que definir valores e comunicá-los, é preciso vivê-los. A liderança pelo exemplo é fundamental.
- Liderança pelo exemplo: O exemplo arrasta. É o que faz sentirmos confiança. Os líderes devem ser os primeiros a incorporar os valores da empresa, inspirando suas equipes. Para isso, precisam estar no centro das discussões, sendo desafiados a refletir sobre como agiriam em diferentes situações e colocando o compliance em prática.
- Comunicação transparente: Crie canais de comunicação abertos e transparentes, para que os colaboradores se sintam à vontade para expressar suas opiniões e ideias. Eles são os olhos e ouvidos da empresa. Ouça genuinamente o seu público interno. Faça-o parte integrante das decisões. Isso é poderoso! Aqui se faz a cultura e o senso de comunidade.
- Reconhecimento e recompensa: Reconheça e recompense os colaboradores que demonstram os comportamentos desejados, reforçando a cultura da empresa. Sejamos francos: nós gostamos de reconhecimento. Não precisa de muita coisa. Às vezes, um simples “OBRIGADO(A), nós estamos vendo os seus esforços” dá senso de dono, aquela sensação de “eu sou visto”, “eu faço parte”.
2. Compliance: prevenção e estratégia
Compliance não se resume a cumprir leis e regulamentos. É preciso ir além, adotando uma postura proativa e estratégica para evitar riscos e proteger a reputação da empresa.
É aqui que mais uma vez as empresas erram. Chamam o compliance só na hora de “apagar incêndios”. Já temos colecionado tantos exemplos ruins. Até quando?
No caso da American Airlines, uma atuação mais estratégica do compliance poderia ter prevenido a crise. Imagine se a empresa tivesse:
- Mapeado devidamente os riscos: Identificado os pontos críticos na jornada do cliente, como intercorrências em solo, em voo, overbooking, alterações de última hora e realocação de passageiros, e promovido ações objetivas e concretas para esses casos, com critérios e regras transparentes para cada situação, priorizando a satisfação do cliente e evitando qualquer tipo de ação contrária a leis e direitos individuais e coletivos, consumeristas e constitucionais.
- Treinado efetivamente as equipes: Capacitado os funcionários para lidar com situações de conflito, utilizando técnicas de comunicação não violenta e oferecendo soluções justas aos passageiros. Experiências práticas e simulações podem ser mais eficazes do que treinamentos tradicionais em vídeos e slides. Afinal, é preciso que os funcionários se sintam impactados e reflitam sobre como agir em situações reais.
- Monitorado devidamente os processos: Acompanhado de perto os indicadores de satisfação do cliente, número de reclamações e incidentes, para identificar áreas de aprimoramento. Será que o caso da Ingrid foi um incidente isolado? Relatos nas redes sociais indicam que não. E o incidente aconteceu justamente com uma figura pública, o que amplificou ainda mais a repercussão do caso. O Brasil tem um poder de comunidade muito forte, como vimos recentemente na torcida maciça pelo tenista João Fonseca e na mobilização em torno da indicação da Fernanda Torres ao Oscar. Esse engajamento, amplificado pelo uso massivo das redes sociais – o Brasil é o terceiro país no ranking global de consumo de mídias sociais – transcende fronteiras e impacta a comunidade global. No caso da Ingrid Guimarães, essa força se manifestou na defesa da atriz e na crítica à American Airlines, demonstrando que o público brasileiro não tolera injustiças e se solidariza com quem é prejudicado.
3. Gerenciamento de Crise: agir com rapidez e transparência
Quando a crise acontece, é preciso agir rápido e com transparência para minimizar os danos à reputação da empresa. No caso da American Airlines, a falta de uma resposta rápida e eficaz agravou a situação. Os clientes, especialmente brasileiros, manifestaram-se nas redes sociais da empresa com comentários, e a empresa simplesmente ignorou. Um fator que agrava ainda mais a situação é que o incidente aconteceu com uma mulher um dia antes do Dia Internacional da Mulher, e a empresa postou em suas redes um vídeo comemorativo.
O que a empresa já deveria ter feito?
- Reconhecer o erro: Assumir publicamente a falha e pedir desculpas à Ingrid Guimarães e aos demais passageiros afetados.
- Agir com rapidez: Oferecer uma compensação justa à atriz e tomar medidas para evitar que a situação se repita.
- Comunicar com transparência: Informar a todos os stakeholders sobre as ações que estão sendo tomadas para solucionar o problema.
- Monitorar a repercussão: Acompanhar as redes sociais e a mídia para entender a percepção do público e responder aos comentários de forma transparente.
Lições aprendidas:
O caso Ingrid Guimarães nos ensina que:
- A cultura organizacional é a base para um bom atendimento ao cliente e para a prevenção de crises.
- Não negligenciem o poder do compliance. Compliance aporta valor e viabiliza negócios sustentáveis.
- Compliance é estratégico e é fundamental para proteger a reputação da empresa.
- Gerenciamento de crise exige rapidez, transparência e ações eficazes.
Que essa história sirva de aprendizado para todas as empresas! Invista em cultura, compliance e gestão de crise para construir uma marca forte, resiliente e admirada por todos.
Sobre a Autora: Aline Baldoni, sou advogada e especialista em Direito Corporativo, Governança Corporativa, Riscos, Compliance, Investigações, Gestão de Canais de Denúncias, Privacidade e Proteção de Dados e Gerenciamento de Crises, e eu acredito no potencial humano e que jurídico e compliance podem ser aliados das áreas de negócios para a geração de resultados concretos.
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