Ultimamente, após anos de abusos gastronômicos, tenho tentado manter uma dieta saudável, pois cada vez mais com a minha experiência acredito em uma frase da qual não sei a autoria para dar os devidos créditos, mas que diz que “você é o que você come”.
Porém, de vez em quando e sem abusos, comer alguns “colesteróis ruins” não é de todo mal e, vamos combinar que, poucas pessoas que eu conheço conseguem resistir a um hambúrguer com batatas fritas ou a uma boa pizza. Como disse, ou tentou dizer, uma nutricionista que ficou famosa anos atrás (infelizmente não por um bom motivo): “até o sanduíche tem seu valor nutritivo”.
Foi em um destes dias de cardápios “extrovertidos” que a minha relação com sanduíches e integridade aconteceu.
Estava na casa de parentes e decidimos que iríamos pedir alguns hambúrgueres para o jantar. Me ofereci e solicitei os sanduíches por meio de um destes aplicativos famosos. Pedido feito, previsão de entrega na tela do meu celular, continuamos a conversa.
O tempo passa na mesma proporção que a previsão de entrega não é cumprida. Retorno ao aplicativo e vou à seção de problemas que me coloca em contato via telefone com a lanchonete. Problema relatado, o atendente me diz para esperar na linha que iria contatar o entregador. Retorna e me informa que o entregador estava já há 15 minutos na portaria e que o porteiro não estava conseguindo contato. Agradeci, desliguei a ligação, pensei haver um problema com o interfone e desci na portaria para resolver o caso.
Ao chegar à portaria não vi ninguém além do porteiro, ao qual eu pergunto sobre o entregador. O porteiro me informa que o mesmo tinha dito a ele que a entrega era em outra unidade e os dois tinham ficado por dez minutos tentando pelo interfone chamar esta unidade sem sucesso e, que após este período, o morador teria atendido e ido lá retirar os lanches (?????).
Eu não moro no condomínio e, por uma dessas coincidências da vida, o morador da unidade ao qual o entregador disse ser a entrega e que retirou os sanduíches tem o mesmo nome que o meu.
Explicações dadas ao porteiro, ele chama pelo interfone o cidadão e explica a situação. Desliga o aparelho demonstrando através de sua expressão certa indignação, se vira para mim e meio que gaguejando diz “ele disse que já abriu, já está comendo e desligou na minha cara”……
Contatei novamente o restaurante que, gentil e cordialmente, admitiu que o entregador cometeu um erro ao informar o número da unidade e nos enviou outros lanches.
Independente do equívoco do entregador, vamos nos limitar aos fatos, o cidadão pegou um lanche que não era dele e mesmo sabendo que não era dele comeu. E, a não ser que estivesse com uma fome brutal, deve ter comido por dias, pois o pedido era para cinco pessoas e até onde me informei ele reside sozinho.
O mais grave ainda é saber que dias após, um responsável do condomínio procurou o mesmo para falar do ocorrido e, mesmo após ter dito a ele se sabia que alguém, provavelmente o entregador, teria assumido o prejuízo, ele “deu de ombros”, como se não se importasse com nada.
Existe um pensamento do filósofo Immanuel Kant, muito difundido pelo Mário Sergio Cortella, que define que não é ético tudo aquilo que não pode contar a ninguém o que e como fez. No caso do cidadão do sanduíche, eu imagino que este pensamento por um lado não é muito aplicável, uma vez que posso imaginar ele contando a seus amigos e rindo que entregaram uns sanduíches errados na sua casa e que ele comeu. Ao mesmo tempo em que o pensamento é aplicável, pois a atitude demonstra a ausência de integridade do mesmo e de todos que, eventualmente, tenham escutado o relato e achado normal ou até engraçado.
Nos últimos tempos em que o tema corrupção não é incomum de ser tratado por todos em conversas, redes sociais e diversos outros meios como algo inaceitável, quem sabe até pelo cidadão dos sanduíches, muitas vezes não nos damos conta que a origem desta pode estar até nos pequenos atos.
Assim como os avanços significativos no tema de integridade que vem ocorrendo com o mundo corporativo, entendo que a sociedade brasileira também devia se espelhar e adotar cada vez mais práticas de integridade nas relações sociais.
Eu sou otimista e ainda acredito que este país é maravilhoso e tem jeito, não a curto, mas talvez a médio e a longo prazo. Porém, se queremos deixar um legado para nossos filhos e netos, que tal começar por ensinar-lhes a ter integridade nos pequenos atos do dia a dia, como, por exemplo, não se apropriando do que não é seu, mesmo que sejam meros sanduíches.
Sobre o Autor: Graduado em Administração de Empresas e Ciência Contábeis, com MBA em Auditoria Interna. Possui especialização e certificação profissional em Investigações Corporativas. de 20 anos de experiência com Auditoria Interna, Controles Internos e Gestão de Riscos, tendo atuado em cargos de gestão em Big Four e empresa S.A. do ramo agrícola com capital aberto em NY. Atua como responsável da Área de Auditoria Interna em empresa de capital aberto no Brasil do ramo imobiliário e de varejo.
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